quarta-feira, 6 de março de 2013

Nomeado herdeiro, Maduro terá de aplacar os rivais

Morte de presidente pode disparar disputa interna no partido

Janaína Figueiredo, correspondente (Email · Facebook · Twitter)
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O vice-presidente venezuelano, Nicolás Maduro
Foto: DIVULGAÇÃO/REUTERS
O vice-presidente venezuelano, Nicolás Maduro DIVULGAÇÃO/REUTERS
BUENOS AIRES — Muitos venezuelanos acreditam que o verdadeiro objetivo do presidente Hugo Chávez em sua última “cadena” (como são chamados os pronunciamentos em rede nacional de rádio e TV e na Venezuela), em meados de dezembro passado, foi anunciar ao país e ao mundo o nome do homem escolhido por ele para ser seu sucessor. Após meses de especulações e disputas internas, o líder bolivariano defendeu, enfaticamente, a candidatura de seu vice, Nicolás Maduro, em futuras eleições presidenciais.
Maduro, um ex-motorista do metrô de Caracas que transformou-se em homem de confiança do presidente e, nos últimos tempos, do governo cubano, estava sentado ao lado de Chávez. Na mesma mesa, também estava o presidente da Assembleia Nacional, o militar reformado Diosdado Cabello, apontado por analistas locais como o principal adversário de Maduro na disputa pelo controle do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), agora sem Chávez.
Em tom dramático, o presidente assegurou que seu respaldo a Maduro era “firme, pleno como a Lua cheia, irrevogável, absoluto e total”.
- (Maduro) É um dos líderes jovens de maior capacidade para continuar, com sua mão firme, seu olhar, seu coração de homem de povo - declarou o líder bolivariano.
O recado foi dado e Cabello, publicamente, negou “intrigas” dentro do chavismo. Depois de o chefe de Estado ter optado por Maduro, o presidente da Assembleia Nacional, homem que já foi vice-presidente, ministro do Interior e da Justiça, assegurou que Chávez “podia estar tranquilo”.
- Aqui não existem intrigas, querem inventar brigas entre Diosdado e Nicolás, Nicolás e Elias (Jaua) e assim sucessivamente - declarou Cabello.
O dirigente chavista mostrou-se comprometido com a “unidade revolucionária”, essencial para “garantir a continuidade do socialismo bolivariano”. Mas as palavras de Cabello, militar reformado que participou, junto com Chávez, das rebeliões militares de fevereiro e novembro de 1992, não convenceram alguns jornalistas e analistas locais. Para muitos, as divisões dentro do chavismo são profundas e a morte do presidente só acentuará um cenário complexo e delicado. Maduro poderá ser o candidato e eventual futuro presidente do país, mas dentro do movimento político fundado por Chávez terá vários adversários.
Cabello não seria o único dirigente do PSUV interessado em construir uma liderança no chavismo sem Chávez. Existem outros dirigentes com a mesma ambição, como o chanceler Elías Jaua, que em dezembro passado disputou o governo do estado de Miranda e foi derrotado por Henrique Capriles.
- Chávez informou seu testamento político em vida, mas agora, sem Chávez, outras lideranças como a da Cabello poderiam discuti-lo - disse o jornalista Vladimir Villegas, um ex-chavista, que há muitos anos rompeu com a revolução bolivariana.
Segundo ele, “com Chávez vivo, Cabello não tinha chances. Sem a presença do presidente, é difícil saber o que acontecerá, tudo dependerá da capacidade do PSUV para manter-se unido”
- A ruptura seria fatal para o chavismo e o PSUV sabe disso - assegurou Villegas, cujo irmão, Ernesto Villegas, é ministro da Comunicação Popular.
Ele acredita que o cenário mais previsível prevê o respeito, por parte de todos os chavistas, do último pedido do presidente. No entanto, frisou o jornalista, “agendas ocultas não podem ser descartadas”.
O mais presente
Desde os primeiros tratamentos, em meados de 2011, Maduro foi o funcionário que mais esteve ao lado de Chávez, em Cuba. Em todo esse tempo, o vice conquistou a confiança do governo cubano, que teria tido grande influência na decisão final anunciada pelo presidente venezuelano. Raúl e Fidel Castro não confiariam em Cabello e seu vínculo com a Venezuela é essencial para o futuro econômico da ilha. De acordo com números recolhidos pela oposição venezuelana, o país mais favorecido por sua aliança com a Venezuela chavista foi Cuba, que entre 2005 e 2011 obteve em torno de US$ 28,5 bilhões. Estima-se que diariamente são enviados 120 mil barris de petróleo venezuelano à ilha. Somente Maduro, acreditaria o governo Castro, representa a garantia de que a ajuda econômica será mantida na ausência de Chávez.
- Maduro tem a benção dos irmãos Castro. Para os cubanos, o tenente Cabello representa a direita chavista - disse a jornalista Gloria Bastidas.
Segundo ela, os próprios chavistas comentam que “Diosdado Cabello não vê com bons olhos o modelo cubano”. Gloria acredita, porém, que não será tão simples para Cabello aceitar o último desejo de Chávez.
- Cabello controla a Assembleia Nacional, tem influência no Tribunal Supremo de Justiça e no Conselho Nacional Eleitoral. Não sabemos se é mito ou realidade, mas comenta-se que é a cabeça da burguesia empresarial chavista - afirmou a jornalista venezuelana.
O presidente da Assembleia Nacional também teria amplos poderes nas Forças Armadas, onde iniciou sua carreira política. Já Maduro não tem qualquer vínculo com os militares, base essencial de respaldo da revolução bolivariana. Quando Chávez informou que seria submetido a uma quarta cirurgia, as Forças Armadas não esperaram sequer um dia para divulgar um comunicado de apoio ao presidente. O que não está claro é se essas mesmas Forças Armadas receberam com satisfação a designação de Maduro como sucessor, ou prefeririam um eventual governo de Cabello.
Em artigo publicado no “Nuevo Herald”, o jornalista Antonio Maria Delgado apontou que “para alguns analistas, Cabello é o segundo homem mais poderoso do país petroleiro, depois de Chávez”. Na mesma reportagem, o analista venezuelano Esteban Gerbasi comentou que Cabello “não pode ser retirado da equação a menos que termine preso ou que o chavismo desapareça da Venezuela. Todos os generais de Diosdado estão no poder. Diosdado tem o melhor relacionamento com os membros do Tribubal Supremo de Justiça e é um militar num país no qual o poder real continua estando em mãos dos que controlam os canhões”.
Se Cabello parece ter mais poder internamente, Maduro conta com o apoio de todos os governos da região. O vice é uma figura conhecida já que foi chanceler da revolução bolivariana e mantém um excelente relacionamento com todos os vizinhos. Nos últimos anos, Maduro participou de várias cúpulas presidenciais do Mercosul e da União de Nações Sul-americanas (Unasul). Quando seu nome foi confirmado como novo vice-presidente do país, em outubro passado, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Antonio Patriota, manifestou a plena satisfação do governo brasileiro.

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